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Mostrando postagens de 2020

Santo Lugar

Numa manhã chuvosa, no meu escritório uma xícara de café, um silêncio profundo, claridade, mas o ambiente ainda meio escuro, A calmaria, o tom melancólico, vislumbro de relance, três segundos, ela, na parede a cruz,   constrastada, à luz e à sombra barroca como minha alma pregada, vazia, distante, solitária, esperando-me.

Diário de um Soldado

Eu estava sem consciência. E sem a consciência do que estava acontecendo, eu não sabia onde es tar , não sabia para onde ir, não sabia como agir. Era tudo tão nublado que até o óbvio estava difícil de ser assimilado. Porém percebi finalmente no decorrer das últimas batalhas uma realidade drástica: eu estava em guerra. Ao ir amadurecendo no campo de batalha, depois de uma longa jornada descolada do mundo real, pus, possivelmente pela primeira vez, os dois pés no chão. Percebi então o quão era doloroso estar com os pés nesse chão. Nele havia muito sofrimento. Entendi finalmente o porquê de tantas vezes eu mergulhar no mar das ilusões da guerra. Eram ilusões de alívio, ilusões de prazer, ilusões de paz. Válvulas de um falso escape. E então uma pergunta surgiu: como eu posso suportar uma realidade tão dolorosa? Sem uma resposta imediata, concluí que era mais fácil continuar fugindo. Porém, através desse percurso de amadurecimento de guerra e muita ajuda da tropa, eu decidi...

A Estética de Deus

. Muitos erros cometi Crendo ter encontrado lá Muitos erros eu cometi Crendo ver já Confundi os sentidos Com a própria Presença Confundi os amigos Com a própria Crença Confundi lugares Permiti o adeus Confundi lares Com a presença de Deus A irmã solidão me encontrou Tive acesso a um miserável coxo Dentro, Este me falou É só estética, é só gosto Os sentidos confundi Tentei voltar Muitos erros, regredi Corri até lá O passado, o calar A permissão, o adeus Finalmente, verbalizar: Confundi, Deus

ANNE WITH AN E: A série que poderia ter sido, mas não foi. Ou foi?

Anne, uma orfã do século XIX, chega à Ilha do Príncipe Eduardo e traz vida ao que estava morto. Como uma vela, a ruiva ilumina as pessoas que a recebem (lá, seus novos pais e, aqui, seus telespectadores). Conforme assistimos aos capítulos, partes mortas de nós vão voltando à vida. Somos iluminados por uma infância-adolescencia – embora incomum – semelhante em muitos aspectos à nossa. Se me pedissem para resumir a personagem principal, eu diria: uma menina extremamente irritante, mas que, de algum modo, é como um rio que não para de jorrar vida. O romance narra uma infância-adolescencia de pontos universais, onde nosso interior é remexido e nosso passado recordado. Através de Anne, lembramos das nossas primeiras amizades, das risadas bobas da infância, dos dramas existenciais adolescentes, das brigas desproporcionais, das reconciliações fáceis, dos amores romantizados, da contemplação das nuvens, das milhares de profissões que teríamos. Quem não sente falta disso? O romance...

Análise da Obra de Arte: Primeira Missa no Brasil - Victor Meirelles

O quadro possui o nome de “Primeira Missa no Brasil” e é considerado a primeira grande obra do pintor brasileiro Victor Meirelles. A tela foi produzida entre 1859 e 1861 em Paris e possui 9m² – 2,68 x 3,56 m. O quadro foi realizado a partir da carta de Pero Vaz de Caminha e inspirado, de certa forma, na Obra de Emile Jean Horace Vernet, intitulada "A primera Misa na Cabília”, região montanhosa no norte da Argélia. A obra conferiu conferiu a Meirelles o grau de cavaleiro Imperial da Ordem da Rosa e o cargo de professor honorário da Academia de Belas Artes, hoje Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A pose – ou gesto – literalmente central da obra é o momento em que, segundo a fé cristã católica, o sacerdote ergue o cálice com vinho e o abaixa como Sangue de Cristo. A análise será feita dentro da perspectiva cristão católica do quadro, não me referindo ao que aconteceu historicamente, mas apenas as informações que estão dadas na obra. Quando Frei H...

Resumo: Introdução à Poesia Oral (1ª Parte) - Paul Zumthor

Neste resumo, pretende-se analisar a primeira parte do livro Introdução à poesia oral – especificamente: 2.Precisando - que trata, basicamente, da relação, ou “confronto”, de oralidade e escritura dentro de noções conceiturais, sociais e literárias. Paul Zumthor inicia o texto apontando a incerteza semântica referente aos termos folclore e cultura popular. Ele faz um pequeno percurso histórico mostrando e questionando – o reducionismo – a respeito da hermenêutica tratada. Por fim, o autor conclui que as concepções percorridas não o satisfazem em totalidade, porém indica algo, vago, mas que em sua concepção é inquestionável: grande parte das sociedades vivenciam tensões culturais, no âmbito “classista”, onde a oprimida detêm a função de desalienação da tradição e reconciliação do homem com o homem e com o mundo, se opondo assim a classe opressora. Novamente, percorrendo considerações de outros autores, infere-se que as tentativas de classificação – distinguindo (temporalmente, ...

Anima Sacerdotal

Pela cidade caminhante Ruínas, lágrimas nos olhos O coração passa orante Quanta dor, sofridos corpos Desespero por segurança Mortos, homens apavorados Na direção contrária, uma esperança De casula, atendendo condenados Chamas, cruzes, mas coragem! És o último sinal dessa era Óh, sacerdote, Sua imagem Ainda há fé sobre a terra! Pulsante por cada dívida Esta aqui para pagar Em troca da própria vida Insistindo em perdoar Óh, herói! óh, professor! Óh, cristo! óh, amor fraternal! Assume com fervor O coração sacerdotal És confessor sublime És mártir de ardor Lembra de Vianney O patrono do Amor

Agni Parthene

Noite densa Temor forte Alma sedenta Doce morte Luz apagada Vazio último Bruma pesada Dom litúrgico Cidade fluída Rebento choroso Lágrima ruída Ombro doloroso Literato nos fossos De nada entendia Como fogo nos ossos Dúbia revelia Expectativa medrosa Fogueira solitária Desesperança formosa Praia celibatária Um espanto de alegria e medo O medo de não conseguir crer No interior do Divino Enredo Alegria por re-escolher Com um esforço duvidável A alma gritante em mazela Da perdição incomparável Ao resgate amoroso dela Pasme: o lume cantara! Os sentidos duvidara Belíssima Formosura Coroadíssima Brasa Zaragoza, Prouille Siena, Lourdes e Fátima Novos cristos sublimes Eu, num mangue, uma lástima - Dobro-me, Venerável! Senhora do Mundo Imaculada Flor Boa Mãe do Caminho Doce Porto do Amor

Sanctum Sacramentum

Miserável, me arrastava Dores em toda a alma Ansioso por um Algo desconhecido Um coração de laboratório, corroído Na solidão vazia caminhava pelas vielas crendo me achar num perder-se, sem lugar Num mundo psicológico Iludi-me Desesperança, é óbvio! Cuspi-me Da minha boca: Algo! No coração espaço Meu espírito orou Minha alma suplicou Um convite de maria, adorável Um salão azul e uma menina inexplicável  Um padrinho, um retiro forçado Um encontro, um Identidade premeditado O medo, a mentira A morte, a doença A culpa, a desesperança A raiva, o ódio A miséria, a dor A solidão, o Negar Docemente, dissipados Pelo Santíssimo Sacramento do Altar

Antero de Quental e Eduardo Lourenço - Sobre Portugual

Antero de Quental em seu discurso sobre as Causas da decadência dos povos peninsulares, aponta três causas da decadência portuguesa e espanhola a partir do século XVII: religião, política e economia. A partir desse olhar para a sociedade portuguesa, esse texto dialogará com Eduardo Lourenço, em sua obra Nós e a Europa ou as duas razões, no qual discorre sobre a importância de se ter um passado original, no qual garante a espessura do presente, e assim, consequentemente, abordará a questão central e problemática que se refere a identidade nacional. Antero organiza sua exposição, basicamente, em três partes, onde, primeiramente, ele dá um respaldo histórico sobre os grandes feitos peninsulares, depois, aponta a decadência a partir do século XVII e, por fim, oferece uma solução. Durante os tempos áureos a nação produzira em seu seio: santos, teólogos, papas, reis, cavalheiros, etc. Eram, segundo o autor, símbolos vivos da alma popular. Estes, sustentavam o espírito peninsular, onde a...

Breve análise do Livro de Linhagens e do Auto da Barca do Inferno - Conde D. Pedro e Gil Vicente

Livro de Linhagens Os Livros de Linhagens constituem um documento de relações genealógicas de membros de famílias nobres, porém, os mesmos não se reduzem a essa função. O impacto das narrativas no imaginário popular – social, cultural e histórico - inserem marcas nas pessoas, mais especificamente, a narrativa mítica, por exemplo, é parte essencial na formação da identidade familiar/nacional de Portugal. A identidade é a memória coletiva, na qual determina as características de um povo, ou de uma família. A história da velha lenda da Dama do Pé de Cabra ou de Dona Marinha vem tratar da origem de famílias nas quais se constituíram a partir da união de um cavalheiro com uma mulher desconhecida e sobrenatural. Nesse sentido, muito mais do que um documento histórico, o registro tem como intuito determinar a identidade das famílias e por consequência de parte da nação. O casamento de um cavalheiro cristão com uma mulher “extraterrestre” fundamenta aos olhos dos homens, por exemplo, o ...

O Mito Grego e o Logos Divino

Aqui, procuro contrapor o significado de mito e logos, e, de maneira um pouco mais profunda, discorrer sobre a diferença de ambos no sentido de relato de crenças (mitos) e relato de testemunhas (logos), a partir das explicações sobre a criação do mundo, abrangendo a questão da crença mítica grega e a fé no Logos divino cristão. Ao procurar no dicionário, é possível encontrar a palavra mito relacionada a fantasia, delírio e até mentira, mas também consta, ainda que de maneira incompleta, um significado fundamental: narrativa de teor simbólico e verosimilhante. Eu complementaria que o mito teve e tem função fundamental na cultura de qualquer grupo de pessoas/povo. Digo isso, pois olhando para a historiografia e o estudo, por exemplo, de Lacan e Freud, evidencia-se que o homem é um animal simbólico. A natureza humana exige sentido e o mito e sua simbologia o ajudam a configurar sentido as coisas, sustentando e fundamentando a cultura. O logos – em grego, palavra – significava n...

Reflexões sobre o Papel Social da Poesia: Platão x Aristóteles

A discussão acerca das artes, de um modo geral, é algo que discorre por toda a história humana, tendo boa parte de seus debates iniciados no período clássico – entretanto, sabe-se que a divergência entre filósofos e poetas é antecedente. Nesse período, a palavra Literatura ainda não existia, porém suas formas iniciais já estavam sendo tratadas por dois grandes pensadores da época: Platão e Aristóteles. O primeiro, é bastante crítico à poesia, ele a considera muito distante da realidade, pois seria uma mera imitação da mesma e por isso não seria boa para a formação de um homem virtuoso. Aristóteles, seu aluno, em oposição, diz que a imitação é boa, pois é fonte de prazer e conhecimento. O estudo desses dois filósofos atingiram patamares impressionantes, influenciando a civilização até os dias de hoje, entretanto os mesmos não encerram a complexidade da literatura. O pensamento Platônico compreende que a arte reproduz cópias do mundo sensível que por sua vez já são uma cópia do mun...

A Limitação do Saber ou da Linguagem - Roland Barthes e Platão

Disserto aqui sobre a última questão (questão oito), onde Roland Barthes discorre acerca do saber, onde a literatura é categoricamente realista, na medida que ela tem o real por objeto do desejo, mas afirma também, segundo ele, sem se contradizer, que ela é também: irrealista. Diante dessa brecha ou armadilha, assumindo o risco e tentando também não me contradizer, infiro que esse irrealismo, intencionalmente ou não, se assemelha ou se aproxima do idealismo/realismo platônico. Tentando traçar algum paralelo, exponho algumas anotações que me ocorreram diante da segunda força da literatura – a representação – e algumas concepções filosóficas. Invocando meu senhorio diante do texto, associo a impossibilidade da representação do real com a visão platônica – idealisticamente real – acerca das imagens primordiais e as suas cópias. Essas primeiras, pertencentes a uma realidade autônoma e perfeita não são expressas de maneira fidedigna no mundo sensível, apenas de maneira imperfeita. Den...

Reflexões sobre o Hedonismo e a Morte

O hedonismo pode ser combatido com esta arma: a morte. Quando há a soberba na carne, pode-se aparecer um impuslo sexual desenfreado. Porém, a consciência, tentando se elevar, relutará. Dentro da sabedoria cristã, o prazer sexual deve ser vivido de forma ordenada no casamento, ou melhor, após o recebimento da permissão consciente e verdadeira da esposa – ou do marido – e a do próprio Deus. Dentro dessa complexa e profunda realidade, é importante lembrar que um anel é apenas uma lata sem propósito, mas uma aliança é a união de duas almas generosas que escolheram elevar uma a outra ao cume da Existência. Sempre haverá essa tensão dialética entre o "eu" pecador e o "eu" ideal, sua carne confrontrará sua consciência, haverá falseamento, isto está entranhado na pessoa humana. Existe uma parte do homem e da mulher, e essa parte deve ser fortalecida, que luta contra as inclinações ruins. Abrir-se para os prazeres da carne é abrir-se para a infelicidade. Uma vez que se adqu...