Disserto aqui sobre a última questão (questão oito), onde Roland Barthes discorre acerca do saber, onde a literatura é categoricamente realista, na medida que ela tem o real por objeto do desejo, mas afirma também, segundo ele, sem se contradizer, que ela é também: irrealista. Diante dessa brecha ou armadilha, assumindo o risco e tentando também não me contradizer, infiro que esse irrealismo, intencionalmente ou não, se assemelha ou se aproxima do idealismo/realismo platônico. Tentando traçar algum paralelo, exponho algumas anotações que me ocorreram diante da segunda força da literatura – a representação – e algumas concepções filosóficas.
Invocando meu senhorio diante do texto, associo a impossibilidade da representação do real com a visão platônica – idealisticamente real – acerca das imagens primordiais e as suas cópias. Essas primeiras, pertencentes a uma realidade autônoma e perfeita não são expressas de maneira fidedigna no mundo sensível, apenas de maneira imperfeita. Dentro da literatura, Roland Barthes atribui esse problema a questão das ordens pluridimensional (o real) e unidimensional (a linguagem), onde a linguagem não dá conta do real. Portanto, o autor afirma que a literatura nasce da tentativa dos homens representarem o real.
No decorrer da história, a literatura assume o grande desafio de lidar com o impossível. Entretanto, o próprio autor diz “os homens não se conformam” e por isso temos registrado relatos de homens de todos os tempos que ao se depararem com um fato, muitas vezes, não podem – ou não conseguem – expressá-lo de forma plena. Platão vai dizer que ao vir habitar no corpo, a alma esquece das ideias perfeitas, porém ao ter contato com a natureza, a alma vai se “lembrando” e passa a ansiar pela perfeição. Do mesmo modo, as pessoas não conseguem compreender o real em totalidade apesar de experimentá-lo, e por isso anseiam a todo custo pela perfeita expressão daquilo que experimentaram em algum lugar. Saltando de, mais ou menos, 420 a.C para 50 d.C, o autor bíblico da carta ao povo de Corinto, Paulo, faz um relato sobre essa mesma impossibilidade do saber, porém de maneira esperançosa:
“Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, em breve veremos face a face. Agora conheço em parte; em breve, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido.” (1 Cor 13, 11-12)
Nesse mesmo contexto, o autor sagrado, concorda com Platão quando diz que o corpo é um cárcere, ademais os dois abrangem a problemática incorrida por Roland Barthes, na qual admite a inadequação fundamental da linguagem ao real. Não obstante a origem do real – seja ele na “ideia platônica” ou no “ser aristotélico”, o que está evidenciado é a importância de continuar acreditando ser sensato o desejo do, que é dito, impossível, ou seja, independente de onde está o real, ele precisa continuar sendo o objeto de desejo humano e literário, segundo os autores. Ainda que sejamos criancinhas que não suportam comida sólida, que aceitemos o leite materno, seja ele, por enquanto, o tratamento do real pelo simbólico ou o conceito da utopia de linguagem.
Por fim, aspiro, primeiramente, sendo o caso, a absolvição pelo ferimento da temática, e após isso, a um vocativo: que continuemos incessantemente não nos conformando, buscando em todas as áreas – seja na literatura, na filosofia, ou mesmo, na nossa biografia – buscando a representação máxima, ou mais aproximada, da realidade das coisas, de sua verdade.
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