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[Paráfrase Divina] ou [Paradoxo Profano]

  É quando diminuímos que aumentamos. Essa paráfrase do texto sagrado me impõe uma reflexão urgente: para quem é tal fórmula? Lembro-me da frustração daquele jovem, rico, quando ouviu as sagradas palavras: abre mão de tudo e vem comigo; ele pensou: cumprir alguns mandamentos, ok, mas abrir mão de tudo? E voltou para casa, com a fórmula ao avesso: aumentado, porém atrofiado. Por outro lado, também lembro daquela moça, pobre, de pais Joaquim e Ana, que fora visitada pelo anjo de Deus. A sagrada criatura anuncia o convite divino – uma verdadeira enrascada – que pega a moça quase desprevenida, porém, ainda se recompondo de tal susto, e ao contrário do jovem, a moça, estranhamente, aceita. Ninguém aceitaria convite tão absurdo, mas, pasme, ela aceitou. Ocorre que o jovem, rico, não se deixou diminuir e provavelmente viveu toda a sua vida de maneira confortável.   A moça, pobre, tomou o caminho contrário, se deixou diminuir e – sabemos –   viveu uma vida absolutamente des...
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Se vocês soubessem como é excitante

  A gente sempre acha que as coisas “vão acontecer”, que as oportunidades vão rolar, que magicamente as portas vão se abrir, que, à medida que o tempo passar, as coisas vão melhorar, mas, na real, não é bem assim que acontece. Isso é apenas uma fantasia infantil, uma ilusão que a gente cria para fazer um carinho na nossa própria consciência. A real é que as coisas podem sim dar errado. E se essa declaração te dói é porque você ainda não amadureceu muito.   Há alguns anos, cinco ou seis, venho me esforçando para ser melhor. Melhor em vários âmbitos da vida. Há dois anos, eu posso dizer que o nível subiu, as dificuldades aumentaram. À medida que eu avancei na minha jornada, o espaço se afunilou. Muitas responsabilidades. Muito peso. Muito risco. Vejo, hoje, muita gente vivendo uma vida diferente da minha. Diferente no sentido de que elas sentem medo – assim como eu –, mas não ousam avançar. De fato, é muito desconfortável sair do lugar que você se acostumou a estar. Eu pas...

Santo Lugar

Numa manhã chuvosa, no meu escritório uma xícara de café, um silêncio profundo, claridade, mas o ambiente ainda meio escuro, A calmaria, o tom melancólico, vislumbro de relance, três segundos, ela, na parede a cruz,   constrastada, à luz e à sombra barroca como minha alma pregada, vazia, distante, solitária, esperando-me.

Diário de um Soldado

Eu estava sem consciência. E sem a consciência do que estava acontecendo, eu não sabia onde es tar , não sabia para onde ir, não sabia como agir. Era tudo tão nublado que até o óbvio estava difícil de ser assimilado. Porém percebi finalmente no decorrer das últimas batalhas uma realidade drástica: eu estava em guerra. Ao ir amadurecendo no campo de batalha, depois de uma longa jornada descolada do mundo real, pus, possivelmente pela primeira vez, os dois pés no chão. Percebi então o quão era doloroso estar com os pés nesse chão. Nele havia muito sofrimento. Entendi finalmente o porquê de tantas vezes eu mergulhar no mar das ilusões da guerra. Eram ilusões de alívio, ilusões de prazer, ilusões de paz. Válvulas de um falso escape. E então uma pergunta surgiu: como eu posso suportar uma realidade tão dolorosa? Sem uma resposta imediata, concluí que era mais fácil continuar fugindo. Porém, através desse percurso de amadurecimento de guerra e muita ajuda da tropa, eu decidi...

A Estética de Deus

. Muitos erros cometi Crendo ter encontrado lá Muitos erros eu cometi Crendo ver já Confundi os sentidos Com a própria Presença Confundi os amigos Com a própria Crença Confundi lugares Permiti o adeus Confundi lares Com a presença de Deus A irmã solidão me encontrou Tive acesso a um miserável coxo Dentro, Este me falou É só estética, é só gosto Os sentidos confundi Tentei voltar Muitos erros, regredi Corri até lá O passado, o calar A permissão, o adeus Finalmente, verbalizar: Confundi, Deus

ANNE WITH AN E: A série que poderia ter sido, mas não foi. Ou foi?

Anne, uma orfã do século XIX, chega à Ilha do Príncipe Eduardo e traz vida ao que estava morto. Como uma vela, a ruiva ilumina as pessoas que a recebem (lá, seus novos pais e, aqui, seus telespectadores). Conforme assistimos aos capítulos, partes mortas de nós vão voltando à vida. Somos iluminados por uma infância-adolescencia – embora incomum – semelhante em muitos aspectos à nossa. Se me pedissem para resumir a personagem principal, eu diria: uma menina extremamente irritante, mas que, de algum modo, é como um rio que não para de jorrar vida. O romance narra uma infância-adolescencia de pontos universais, onde nosso interior é remexido e nosso passado recordado. Através de Anne, lembramos das nossas primeiras amizades, das risadas bobas da infância, dos dramas existenciais adolescentes, das brigas desproporcionais, das reconciliações fáceis, dos amores romantizados, da contemplação das nuvens, das milhares de profissões que teríamos. Quem não sente falta disso? O romance...